terça-feira, 27 de junho de 2023

Ideologia Socialista x Ideologia Capitalista: A Questão da Guerra

Todas as áreas da vida social atual são afetadas, ainda que desigualmente, pela disputa entre o socialismo e o capitalismo. Entre as diversas questões cruciais do nosso tempo, a questão da guerra e a questão ecológica são, com certeza, questões práticas, políticas, econômicas e ideológicas realmente universais e limítrofes. São verdadeiras questões existenciais, como dizem hoje em dia no cenário geopolítico, mas, não por ameaçarem a existência de um país apenas e, sim, de toda a humanidade, ou, pelo menos, desta civilização. São, por isso mesmo, questões que, no presente, não podem ser ignoradas de modo algum. E são também questões em que a ideologia socialista se diferencia da ideologia capitalista, de modo direto e inequívoco. Vamos considerar agora a questão da guerra e a questão ecológica será o foco de texto posterior. O capitalismo está, em toda a sua história, inequivocamente ligado a guerras e ao imperialismo entre as nações, assim como também está ligado, dentro das nações, a todas as formas econômicas e políticas possíveis de dominação e exploração. Pode-se até alegar que as formas sociopolíticas mais próprias ao capitalismo são a democracia política e, inclusive, a social-democracia. Mas, ninguém pode negar que o capitalismo, conviveu, e convive bem até hoje, com todas as formas de exploração e de abuso de ordem econômica e política, incluindo ditaduras, tiranias e escravidão. E também não se pode negar que, em toda a história do capitalismo, sempre houve algum tipo de imperialismo e colonialismo entre os países no mundo. Não era mesmo de se esperar algo diferente de uma ideologia do conflito e da violência, ou, da paz imposta pelo conflito e pela violência. Preciso explicar isto. A economia capitalista liberal é a economia da livre competição e da liberdade de acumulação. A acumulação ilimitada é, incontestavelmente, um fundamento do liberalismo capitalista, ou, simplesmente, do capitalismo. Isto leva a desequilíbrios de poder extremos no interior de cada país, ao mesmo tempo que sustenta e promove um sistema de grande desigualdade também entre os povos ou nações no mundo. A dominação e a exploração entre entre as classes no interior de cada país e entre os países no mundo são, portanto, inerentes à lógica econômica capitalista. De fato, a imposição de poder é mais do que aceitável, ou, desejável, é algo é necessário no sistema capitalista. É próprio ao modo de produção capitalista. A ideologia capitalista é uma ideologia de dominação, travestida de libertação. Hoje podemos ver isto melhor. A liberdade de acumulação capitalista é, ao fim, a liberdade de dominação e exploração, é a livre dominação do poder dos capitalistas na sociedade e dos países imperialistas no mundo. Não é de se estranhar, portanto, que as guerras entre países sejam frequentes ou constantes no sistema capitalista mundial. Ao contrário, é óbvio que, no capitalismo, o poder internacional ainda se impõe através do militarismo e da guerra. No limite, a hegemonia entre as nações no capitalismo é conquistada e imposta pela força, por meios econômicos e pela guerra propriamente dita. Ações de guerra imperialista tanto econômicas quanto militares são, realmente, inerentes ao sistema capitalista e constantes na sua história. Também parece muito razoável concluir que o capitalismo também tende a nos levar a grandes guerras todas as vezes que o sistema apresenta maiores tensões, como nas grandes crises econômicas. Por isto as guerras terminam sendo bem justificadas e bem-aceitas no sistema capitalista. De algum modo elas são realmente necessárias, neste sistema. São necessárias como instrumentos de poder e são necessárias também como forma de queima intensiva de capital físico e humano, como parte, portanto, da solução liberal das grandes crises econômicas capitalistas. Não se pode negar, por outro lado, que as guerras são fenômenos trans históricos, com presença em todos os períodos da história e nem se pode dizer que, neste aspecto, o sistema capitalista contemporâneo seja pior do que as formas sociais anteriores na história. Isto, contudo, não pode nos impedir de enxergar a barbárie absurda e inaceitável da guerra. Absurdo que, obviamente, é tão maior quanto maior for o nosso desenvolvimento em geral. A guerra é uma forma legal, justificada, organizada e sistematizada, quase ritualizada, de destruição e de assassinatos coletivos. Principalmente de jovens. Como não reconhecer nisto um máximo de absurdidade e estupidez? Como não lembrar dos sacrifícios humanos nos rituais de culturas ancestrais? E como isto pode ser justificado ainda hoje? Não, não pode, e a guerra é realmente injustificável. Tem que ser, por todos os meios, impedida historicamente, como, em algum tempo, os sacrifícios cerimoniais o foram. Hoje, na guerra mais amplamente divulgada, uma das forças armadas envolvidas diretamente no conflito utiliza uma tática militar chamada de “moedor de carne”. Isto mesmo, é um moedor de carne humana. É o sistema operando para a morte, diretamente, sem qualquer limite. E todos os que falam em nome da sacralidade da vida humana agora se calam ou, no máximo, murmuram impotentes. No sistema atual, como antes, a guerra é, de algum modo, aceita e justificada. Mas, de fato a guerra não pode ser aceita, não pode jamais ser justificada e sua absurdidade extrema tem sempre que ser denunciada e condenada. Outros caminhos têm que ser abertos para que as guerras se tornem impossíveis, ou, pelo menos, muito improváveis, ao contrário do sistema atual em que as guerras são muito mais do que prováveis, são necessárias. A ideologia capitalista sempre busca fazer parecer que os seus erros estruturantes, como este, são condições da própria natureza humana e, de tal modo fundamentais, que a tentativa de corrigi-los levaria a algo pior ainda. E os becos sem saída de tentativas de socialismo do século passado pareciam dar razão à ideologia liberal capitalista de modo que a guerra, a dominação e a exploração capitalistas até pareceram serem realmente inevitáveis e insuperáveis. Mas, como sustentei em textos anteriores, a roda da história já girou de novo e não estamos mais no momento de ascensão do liberalismo e derrocada do socialismo soviético. Ao contrário, estamos no momento de esgotamento da onda neoliberal e de ascensão da China socialista. E, por isto mesmo, já podemos ver melhor. Os que se posicionam pela paz não são inocentes idealistas e os que a defendem a necessidade absoluta ou natural da guerra não são realistas e nem analistas estratégicos brilhantes. Esses sistemas de morte e destruição não são inerentes ao nosso ser e tolo é quem imediatamente aceita a guerra como uma fatalidade da natureza humana. Ao contrário, com o avanço do socialismo deve avançar também a possibilidade e a probabilidade da paz. A perspectiva e a posição socialistas, sob o prisma geopolitico, são aquelas do internacionalismo e do globalismo. Sim, por favor, prestem atenção, o socialismo é, internacionalista e globalista do ponto de vista econômico, do ponto de vista social em geral e do ponto de vista geopolítico em específico. Em sua essência ou lógica própria, o socialismo é uma forma de integração econômica e social transnacional. Portanto, em sua lógica própria o socialismo não estimula a guerra entre as nações, ao contrário, o socialismo deve trabalhar, de modo árduo e persistente, pela paz entre as nações.. Em sua perspectiva ideológica a economia socialista é a globalizada, é integrada mundialmente o que corresponde e é, pode-se dizer, até imposto pelos meios de produção atuais. Deposito nisto as minhas melhores esperanças de que transitaremos para a nova onda socializante, agora que estamos no fim da atual onda liberal, com menos dor e sofrimento sociais do que foi no século passado, apesar de estarmos, sob outros aspectos em condições muito semelhantes agora. A integração mundial geral das cadeias produtivas, dos sistemas financeiros, dos mercados consumidores e até mesmo da cultura e do trabalho é realmente muito maior agora, no início do século XXI, do que no início, ou, até em relação a todo o século XX. É bastante curioso e emblemático ver como os países e as forças ideológicas que propugnaram pela globalização na década de 80 do século passado, atendendo a uma necessidade do capitalismo, dos interesses econômicos ou financeiros do sistema, agora têm uma posição antiglobalização, contrária ao avanço da internacionalização econômica e social e contrária aos sistemas e instituições de regulação mundiais. Campeões do internacionalismo, do globalismo e da globalização regridem drasticamente agora ao nacionalismo, ao excepcionalismo, à xenofobia e ao fascismo. Como expliquei em textos anteriores, nada há a estranhar aqui também. Isto é simplesmente correspondente ao momento atual do sistema capitalista mundial Isto é realmente necessário, dado o momento atual de fim da grande onda liberal que vivemos desde os anos 1980. Ao contrário das grandes potências capitalistas e, em especial, em contrário aos EUA, a potência hegemônica no sistema capitalista mundial, a China propõe e tem conseguido estabelecer relações multilaterais de ganho mútuo mundo afora. Não é a toa que a China é hoje o maior parceiro comercial de mais de 130 países e também estende e intensifica suas parcerias com investimentos financeiros e projetos de infraestrutura, em uma rede mundial cada vez mais ampla. É, no plano econômico e geopolítico, a doutrina socialista de ganho mútuo, de ganha-ganha, em contraposição à doutrina capitalista de ganho unilateral e de dominação. Com certeza ninguém pode dizer que o socialismo garantirá o fim das guerras entre países. A história mostra que no processo de transição do capitalismo os países podem viver momentos de revolução armada e tomada violenta do poder. Isto muitas vezes ocorre justamente em um momento de guerra, quando um estado se enfraquece e a revolta popular cresce muito. Portanto, muitas vezes o estado socialista já nasce em guerra com outro país. E, além disso, dentro do sistema capitalista nenhum país jamais estará livre de se envolver em guerras. A não ser que não tenha soberania. Infelizmente estamos ainda imersos em guerras e em imposição violenta de poder. Portanto, a revolução armada e até a guerra entre países ainda podem ser inevitáveis. Não é certo, contudo, dizer que estas sejam guerras socialistas. Não são e o socialismo é realmente pacifista e globalista. A integração econômica e social mundial é inerente à ideologia socialista, que propõe a prosperidade para todos e o desenvolvimento social geral em cada país e no mundo. Isto está em sua lógica interna. E, portanto, esta deve ser uma condição intrínseca e um propósito constante do seu movimento. Estamos agora num daqueles momentos em que a ideologia encontra a realidade como necessidade ou oportunidade. Sim, eu entendo que o pacifismo socialista é uma necessidade do momento histórico. A ameaça de grandes guerras voltou a assombrar o sistema social mundial agora mais do que em qualquer outro momento das últimas 3 décadas, com certeza, e, talvez, das últimas 7 décadas. Para exemplificar, no momento presente a Europa e os US enfrentam queda no crescimento ou recessão e inflação alta. E qual a resposta que eles estão dando? Cortes nos gastos sociais e anticíclicos e aumento dos gastos militares. O resultado disto só pode ser mais dificuldade para sair da crise econômica, mais pobreza, mais crises sociais e mais guerras. O que significa também que o fascismo crescerá como alternativa política e a democracia será ainda mais tripudiada e falsificada nestes países centrais do sistema capitalista mundial. São duas as maiores forças convergentes que fazem a ameaça da guerra aumentar muito agora: a grande crise econômica do fim da onda liberal, que estamos vivendo desde 2007 e a decadência relativa dos EUA, no sistema mundial e internamente, em face da ascensão da China. Talvez a gente deva incluir aí também a consequência imediata disto, a elevação da contraposição entre capitalismo e socialismo no sistema mundial a um novo nível com a ascensão da China. A crise sem solução no liberalismo, cujas respostas só aprofundam o problema e jogam todo o seu peso nas costas dos perdedores, levando ao aumento da pobreza e da miséria; o aparente esgotamento das ferramentas anticíclicas, com a recessão e a inflação golpeando simultaneamente; tudo isto pressiona ainda mais o sistema e põe ainda mais gás na ideologia xenófoba e militarista mundo afora. Mas não é só uma questão ideológica, é também uma resposta objetiva à crise econômica. Com a guerra, como com as quarentenas generalizadas da pandemia, pode-se justificar o injustificável: a paralisação parcial da economia, a quebra de setores e regiões, o desemprego, o grande aumento da pobreza. Estas são, realmente, tanto características da crise quanto respostas necessárias às grandes crises econômicas do capitalismo, ao menos em sua essência liberal. No momento mais crítico da crise econômica capitalista a guerra se torna, portanto, uma alternativa até adequada e aceitável para a sociedade, para a economia social em geral, como foi a quarentena generalizada por tempo ilimitado recentemente, Algo absurdo, mas que, diante do absurdo da crise econômica sem solução, pareceu muito razoável e realmente necessário. O certo é que os sem emprego e sem renda que pipocaram pelo mundo ocidental afora não perguntam o que foi a causa, eles têm uma resposta tranquilizadora e não econômica: “foi a pandemia; não foi a concentração das riquezas, não foi a ganância e a estupidez, foi um fenômeno natural, foi a pandemia”. Pois bem, com certeza, as grandes guerras têm o mesmo efeito moral. Justificam o injustificável, a grande queima de capital, de vidas humanas e de recursos materiais, assim como as quebras generalizadas, o desemprego e a pobreza. Não é verdade? A decadência dos EUA é evidente. O modelo de globalização que eles próprios impuseram, as crises econômicas sem solução das últimas décadas e uma das piores respostas à pandemia do mundo, levaram a um crescimento assustador da degradação econômica e social, material e humana, da pobreza e da miséria, nos EUA, nas últimas décadas, e ainda mais nos últimos anos. A sua inevitável perda de hegemonia ou de poder no cenário mundial também está acontecendo de modo intenso e acelerado no momento. E é óbvio que tudo isto aumenta muito o risco dos EUA se apoiarem mais e mais no seu poder militar, promovendo ainda mais guerras do que já fizeram nos últimos 70 anos. Não foram poucas, ao contrário, o número de guerras com participação direta e promovidas pelos EUA depois da segunda guerra mundial é assustador. E tende a piorar agora. Pois, agora não há uma boa solução imediata para os EUA no modelo capitalista. Ao contrário, as apostas na concentração de renda e na desindustrialização estão cobrando seu preço e não será fácil reverter tudo isto e nem ao menos de conter os seus danos. Enquanto isto, com todas as dificuldades da pandemia e da crise mundial a China continua mantendo um crescimento bem maior; E estende e aprofunda suas alianças comerciais e sua integração produtiva e financeira com o mundo todo. Os impulsos para a guerra, que vêm da crise econômica e da perda de hegemonia dos EUA, com a ascensão da China no mundo, tomam um caráter ainda mais ameaçador pelo fato que, ao fim, o conflito entre EUA e China é e será, de qualquer modo, o conflito entre capitalismo e socialismo, que se apresenta em movimento intenso e acelerado agora e assim será ainda mais nos próximos anos, nas próximas décadas. A questão existencial que se coloca e se colocará cada vez mais para o sistema capitalista, não é apenas aquela de substituição do centro imperialista do sistema, mas de sua sobrevivência histórica. Hoje já parece bastante evidente que, sob quaisquer indicadores sociais ou econômicos a China já superou os EUA ou está em um caminho inexorável para o fazer. E a vitória histórica da China é, queiram as pessoas ou não, uma imensa vitória histórica do socialismo dentro do sistema capitalista mundial. Uma vitória que, obviamente, influencia e influenciará cada vez mais o mundo todo, tanto pela força econômica da própria integração mundial, da globalização, assim como pela força do exemplo moral do caminho chinês. Esta vitória é inevitável, a não ser que o sistema mergulhe em guerras autodesttrutivas extremas. Não é, no entanto, de estranhar que, dadas as condições atuais, as forças dominantes no sistema se alinhem enfim para uma solução absurda e estúpida assim. O socialismo deve resistir à guerra de todo modo. Não há ganho possível para o socialismo com a guerra. Uma grande guerra entre dois blocos liderados pela China e pelos EUA só pode resultar em uma grande regressão, não apenas recessão econômica e destruição da integração mundial, mas de fato uma grande regressão civilizatória. Ou seja, uma regressão no próprio caminho do socialismo. O socialismo deve resistir à guerra de todo modo e deve buscar os caminhos socialistas, de solução globalizante, o desenvolvimento dos fóruns e instrumentos internacionais para o estabelecimento e a garantia da paz. Aquilo que no século passado só ocorreu depois da primeira e da segunda guerras mundiais, nós temos que conseguir, agora, já, antes que seja tarde, desta vez para evitar a guerra e não para consolidar o seu resultado e restabelecer o caminho da paz, da integração e do desenvolvimento mundial. A minha esperança de que agora a gente realmente consiga evitar as grandes guerras, como eu já disse, repousa no aumento da integração econômica e social transnacional e também no fato que a grande potência ascendente no momento é a China socialista, Mas isto não garante nada e a conquista da paz parece realmente ser uma tarefa histórica de todos nós agora. A guerra mundial só interessa ao capitalismo e ao imperialismo.

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