segunda-feira, 13 de junho de 2022

SALA DE SITUAÇÃO MAIO/JUNHO 2022 ANÁLISE DA QUESTÃO DA GUERRA HISTÓRIA ATUAL E SEUS PRESSUPOSTOS ANTROPOLÓGICOS

A decisão moral e a postura ética de todas as pessoas e de qualquer pessoa, em particular, considera 03 dimensões, ou âmbitos de sua própria existência e, portanto, do seu interesse, simultaneamente. Eu já escrevi isto algumas vezes. Os interesses pessoais, os interesses de grupo, e os interesses de gênero, da humanidade. São estas três dimensões de toda e qualquer decisão moral e postura ética. Elas se apresentam necessária e simultaneamente, em toda e qualquer escolha e atitude moral ou postura ética. Em níveis de consciência e elaboração os mais diversos, estas três dimensões estão sempre presentes quando você decide e faz o seu destino na vida. Os seus interesses particulares, os interesses dos grupos aos quais você se vincula e os interesses da humanidade, do gênero humano. E as decisões e atitudes serão tanto mais verdadeiras, conscientes e autônomas, quanto mais o indivíduo tiver consciência destas três dimensões em cada decisão e atitude moral sua. E tão mais falsas, iludidas e estereotipadas serão as decisões que ignorarem a realidade destas três dimensões que necessariamente fazem parte do ato moral. Por outro lado, eu também afirmo, com segurança, que as pessoas, as individualidades humanas, são constituídas por três determinantes fundamentais, que nos formam. São: a determinação do gen, a determinação do ego e a determinação do sistema. Estes três determinantes ou constituintes nos formam a todos nós e por sua vez é também contra estas determinações que nós nos afirmamos ao longo da vida. Veja, os gens determinam muito mas não determinam tudo o que somos, obviamente, nem em termos do corpo biológico. E assim também o ego ou a psiqûe e o sistema determinam muito, muito do que somos, mas não tudo. Obviamente estes três constituintes do ser humano se vinculam aos três interesses presentes na decisão moral. Mas não diretamente, nem univocamente. Ao contrário. O que se pode dizer é que a ideia da humanidade está presente em nossas decisões mesmo de forma inconsciente e que realmente decidimos por toda a humanidade quando tomamos decisões morais. Assim nós constituimos o sistema que nos constitui. E este certamente é o grande designio dos nosso egos. A filosofia e a religião do ponto de vista moral, se colocam neste nível. A religião e a filosofia falam em nome da humanidade. Ao menos a partir do cristianismo. Ou todas, se pensamos no maior grupo humano, ao qual cada religião se endereça, eu creio. Digamos que, nestes níveis de elevação racional e espiritual, da filosofia e da religião,, se pretende falar em nome da humanidade Se a filosofia pode criticar a mitologia que sustenta a moral religiosa, ela própria teve, com o tempo a sua mitologia da razão exposta. Essa mitologia, fabulosa ou racional, não é um problema apenas por ser um erro, mas por ser uma falsidade. E, obviamente, uma falsidade moral é uma imoralidade. Isso quer dizer que, de um modo geral, a moral ou a ética filosófica e a moral ou ética religiosa são, em geral, imoralidades. Chegou o tempo em que nós nos assustamos com o fato de que a humanidade, que nós amamos em nós mesmos, não vive nem da religião e nem da filosofia. E nos assustamos ao ver que a ética estabelece como justo ou moral aquilo que a economia realiza no sistema e o desejo realiza no indivíduo. Enfim, é simples perceber que no tempo da colonização e da escravidão a religião e a filosofia eram, com certeza, predominantemente favoráveis. Assim como são favoráveis às imoralidades dos sistemas de hoje. Alguns podem dizer, com toda a razão até, que chegou o tempo de pensar nas coisas como elas realmente são, chegou o tempo da economia. Mas, nada é estático na vida. E vemos agora, com tranquilidade, mesmo dentro do desespero, não apenas o tempo da produção, mas também o tempo da alma, isso quer dizer, obviamente, também que vemos o tempo da vida e o tempo da palavra ou da arte, mais do que o tempo do dinheiro. A luta ideológica que domina o nosso tempo, Marx estava certo, é aquela entre liberalismo e socialismo. E é em relação a ela, fundamentalmente que as forças sociopolíticas se posicionam na contemporaneidade, ainda. E nós não podemos ter ilusões, precisamos reconhecer os fatos e compreender a teoria, ou seja, reconhecer e compreender a história. Essa é a base, científica, de nosso posicionamento e afirmação. É, portanto, por reconhecer e compreender a história que a gente pode dizer que a linha de tendência histórica é, e não pode não ser, em direção ao socialismo. E, vemos isto mesmo com todos os movimentos pendulares da economia entre estes extremos, de um momento de mais liberalização para outro de maior socialização da produção social e vice versa. É o socialismo a direção de futuro imediato, e tem sido assim desde o fim do século 19. Desde lá as tendências de regulação dos mercados e proteção social, por exemplo, se mostraram vitoriosas sobre o liberalismo na prática e na teoria. Tenho certeza que isto parece muito estranho de ler agora que estamos no ponto máximo de um período de predomínio do liberalismo na cena mundial, que vem desde os anos 80. Mas este extremo liberal no pêndulo histórico está justamente findando agora, nessa sequência de crises econômicas e guerra. E ele será seguido, necessariamente, por um período de maior socialização da economia no interior dos países e no plano mundial. Na verdade, como deve ser, este novo movimento de maior socialização da economia mundial já está em curso inicial, sob todas as contradições impostas pelo momento de predomínio do liberalismo. Esta tendência se assenta em necessidades da própria realidade, ou seja, do próprio capitalismo. Está mais do que claro que, deixado por sua própria conta, o capitalismo produz concentração progressiva de riqueza e crises insustentáveis em função de seu imenso custo econômico e social. A própria história natural do capitalismo leva à sua negação, como também, não podia deixar de ser. É claro que qualquer sistema tem sua resistência e sua plasticidade que lhe permitem perdurar na história. E o capitalismo é um sistema de grande vitalidade. Mas não o suficiente para não estarmos vendo, ao longo das décadas, sua negação progressiva. Podemos dizer, com segurança, que vivemos em um mundo mais socializado do que há 150 ou 200 anos atrás. Apesar de toda a regressão liberal que vivemos nas últimas décadas. Uso o termo regressão não porque não visse necessidade e nem resultados positivos na onda liberalizante inciada na década de 80 do século passado. Não, ela foi, naquela época, algo progressivo, com o grande avanço da globalização e das novas formas de produção que, desde então, ocorreram. Na época eu fiz esta análise e, agora, ela se complementa pelo novo momento histórico em que estamos vivendo. Sim, porque agora estes avanços chegaram ao limite nesta nova estrutura liberal da economia mundial. A grande concentração de renda no interior dos países e a falta de coordenação e devida regulação, nas economias nacionais e no plano mundial, tornam as crises imperativas e sem resposta adequada. Este é o período em que nos encontramos. Estamos, há mais de uma década já, em uma sequência de crises econômicas sem resolução efetiva, ao ponto que, agora, até a loucura propriamente, a extrema loucura sociopolítica, da guerra, das grandes guerras transnacionais, já parece ser uma circunstância ou condição até aceitável e racional. A guerra é um extremo paradoxo do sistema, quando sua irracionalidade vem a tona de modo irrefutável. Por mais razões que tenham as guerras, nada pode negar sua contrariedade e irracionalidade para o próprio sistema. É óbvio, nos próprios termos, que, por mais razões que tenham para uma guerra, mais razões ainda existem para a paz no sistema. E para tudo o que interessa ao sistema humano. Mas sabemos também que as guerras surgem no sistema como uma necessidade incontornável. Num certo tempo, por motivos religiosos, cristãos atacaram muçulmanos. Sob a bandeira da cruz. E pareceu a muitos uma necessidade imperiosa naquela época. Como para muitos parece hoje, fazer a guerra em nome dos seus Estados, de seus países. E, neste momento a guerra lhes parece mais racional do que a paz. Mas a guerra nunca vai ser mais racional do que a paz, para o sistema. Ou, realmente, sejam quais forem as razões da guerra sempre vão haver mais e melhores razões para não fazer ou para terminar a guerra. Seja como for a guerra é um extremo de irracionalidade autodestrutiva que o sistema se permite ou com o qual ele se resolve, na forma de uma crise máxima de agressão e destruição entre os povos. É um extremo de irracionalidade, um delírio de violência e destruição, que parece justificar todos os demais, que atravessam o nosso sistema social atual. Ainda que o sistema necessariamente se resolva com guerras periodicamente e que a competição pareça ser a força motriz do sistema atual, obviamente a guerra tem que ser episódica, apenas.. Como resolver isto? O tempo nos mostrará. Por enquanto, vamos olhar um pouco mais para o presente e refletir sobre isto a partir da realidade atual. Hoje devemos ter mais de 10 guerras declaradas no mundo. Além das diversas guerras não declaradas, entre povos ou no interior de cada nação ou país. Países como o Brasil podem ser considerados, com justiça, como em permanente guerra civil não declarada. Por exemplo, a guerra mais falada no momento é a guerra da Ucrânia, mas é certo que, ao longo de alguns anos, podemos esperar mais mortes por arma de fogo no Brasil do que no território ucraniano. São centenas de milhares de pessoas que morrem, portanto, todos os anos no mundo em conflitos armados, declarados como guerra ou não. Parece mesmo ser uma necessidade do sistema porque não é possível remontar a um período histórico em que tenha sido muito melhor do que isto. Podemos dizer, com certeza que todos os sistemas sociais até agora foram falhos ou fracassaram parcialmente em sua tarefa fundamental de manter a paz, de evitar os conflitos armados de grande proporção e todas as suas consequências destrutivas. Mas, certamente, não há, dentro das possibilidades objetivas, nada que nos condene a repetir sempre os erros do passado. E a paz continuará, necessariamente, sempre, sendo uma condição e uma virtude desejada pelos sistemas sociais. O resultado direto e inquestionável de qualquer guerra é sempre destruição material e de vidas humanas em larga extensão. Podemos, portanto, dizer que a capacidade de manter a paz é uma das maiores virtudes ou mesmo a maior virtude de um sistema social. Pois, obviamente, por melhor que seja o seu desempenho em guerra ele seria melhor ainda em paz. Isso vale em geral e para qualquer guerra em particular, como esta da Ucrânia. A Ucrânia, infelizmente para os ucranianos, surge apenas como bucha de canhão, como zona de conflito, como o campo de destruição e sacrifício de vidas que a Rússia e a OTAN estabeleceram. Como pode haver essa guerra hoje, com os meios de comunicação e interação social atuais, com as capacidades tecnológicas e recursos de produção que já temos disponíveis para nós, como a cultura europeia e norte americana, por um lado, e a russa, por outro, se envolveram nesta destruição e assassinatos de milhares de pessoas na Ucrânia? A troco de quê? É um fracasso particular destas potências e culturas e um fracasso geral do sistema social atual. Esta irracionalidade absoluta não pode ser desconsiderada ou minimizada. É mesmo um grande fracasso das potências envolvidas e do sistema como um todo. Por mais que os Ucranianos resistam é óbvio que esta guerra só terminará quando o poder na Rússia entender que seus objetivos estratégicos foram cumpridos. O que significa, de acrodo com suas próprias declarações, a redução do poder militar ucraniano e a eliminação dos batalhões neo nazistas, a não entrada da Ucrânia na OTAN e o reconhecimento da independência dos territórios russófilos do leste, em uma faixa contínua até a Crimeia e, talvez, provavelmente, até Odessa. Não há possibilidades da Ucrânia se contrapor à Rússia militarmente. A resistência é inútil. Exceto para os interesses geopolíticos do poder nos Estados Unidos e para a indústria da guerra. Toda a propaganda belicista em favor da Ucrânia, todos os recursos militares e toda a grana enviada à Ucrânia neste momento só atendem a estes interesses e só levam a mais mortes e destruição no território ucraniano. E todos os ditos líderes ocidentais sabem disto. Então por que insistem? Pior ainda são as sanções e o aumento dos orçamentos militares em vários países da OTAN. As sanções e as restrições ao comércio de grãos estão levando a novas tensões dentro da grande crise econômica em que nos encontramos, com a inflação e a fome disseminando-se amplamente. Enquanto as expectativas de crescimento econômico são progressivamente reduzidas. Este é o verdadeiro resultado da guerra e vocês podem ter certeza, será muito pior do que a destruição direta causada na Ucrânia. Muito mais pessoas morrerão, enfim, por causa da miséria e da fome que se disseminam mundo afora e são impulsionadas pela guerra econômica, pelas sanções e restrições ao comércio internacional. E essa loucura acontece quando ainda nem nos recuperamos da loucura das quarentenas generalizadas por tempo indeterminado que desestruturaram a economia e a vida social nos últimos 2 anos. E quando ainda pode ter lockout em cidades chave na China. Parece claramente que, neste momento, eles jogam em favor da recessão, da quebra de cadeias produtivas mundiais. E eu creio que sim, ou, já posso ter certeza que sim, mesmo. Hoje muitas forças jogam em favor da crise e da quebra da produção mundial em larga escala. Porque este é um caminho natural, ou, espontâneo, digamos assim, para a resolução das crises econômicas estruturais. O aprofundamento da crise até a destruição de setores ou modos de produção de baixa eficiência econômica e o barateamento da força de trabalho, entre outras condições para um novo ciclo de acumulação e desenvolvimento dentro do capitalismo. Esta necessidade se faz tão imperativa que até as grandes guerras parecem muito mais aceitáveis ou justificáveis nos momentos de crise estrutural capitalista. A guerra realiza, digamos assim, parte do trabalho sujo da crise econômica. Não vou me estender sobre isto porque já documentei esta ideia em textos anteriores. E não posso encerrar este texto sem afirmar e destacar que só há e só pode haver um tipo de guerra justa e justificável, a guerra revolucionária das massas populares, de qualquer povo, contra seus opressores, contra seus escravizadores. Todas as demais são, ao contrário, apenas guerras de dominação e opressão e não têm justificativa possível em relação à vida e à dignidade humanas.

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