segunda-feira, 31 de outubro de 2022

ELEIÇÃO DO LULA. MINHA VISÃO ANARQUISTA: E VAMOS ADIANTE COM NOSSOS CORPOS E SONHOS

ELEIÇÃO DO LULA. MINHA VISÃO ANARQUISTA: E VAMOS ADIANTE COM NOSSOS CORPOS E SONHOS! Estou por um triz também Me emocionei, chorei e ri Mandei os escrotos de volta pros esgotos também. Cantei de volta a ser feliz e repeti 13 13 13 zentas mil vezes Ouvi muito o beat do feijão puro e morri de rir quando ele venceu de novo Me encantei pela sua energia e saúde. Que vitalidade aos 77 É impressionante E que liderança preparada pela história Pra vir falar de unidade e respeito aqui no Brasil Somos contra a violência e isso agora já é bastante Somos pela paz. Mas não somos pela dominação e nem pela subserviência. Porque o outro lado, insanamente, pede e endossa a violência como forma de poder. O poder armado. Os loucos querem que, por exemplo, num conflito de terras a solução seja imposta pelo lado que tem mais armas. Eles simplesmente querem a dominação dos mais poderosos sem contestação. E não é por outra razão que se dizem liberais na economia, porque simplesmente querem o poder econômico dos mais ricos, sem contestação. Essa força social e política que quer a imposição do poder a todo custo e projeta a violência como instrumento legítimo de opressão é o que se chama mesmo de fascismo. Que é certamente a forma final e degenerada do liberalismo no extremo das grandes crises econômicas e socio políticas do capitalismo. E neste aspecto é que derrotamos o fascismo como escolha política para o nosso país, até aqui. Derrotamos o fascismo com a escolha alternativa de esquerda, vermelha ou socialista, se vocês quiserem, e não com uma outra alternativa liberal ou de centro direita. E foi por isto que eu votei nesta eleição depois de quase 30 anos sem votar. E foi por isto que eu fiz campanha e estou aqui agora agradecendo ao Lula e à sua liderança. O discurso consciente e correto em todos os aspectos que ele fez ontem. Estamos no rumo certo, em uma circunstância difícil em todos os aspectos internos e externos. Mas não estamos mais no rumo do fascismo no centro do poder nacional. Sempre fomos uma sociedade fascista. E isso é quase que inevitável em sociedades de grande desigualdade social e sobre a base histórica da escravidão e genocídio de negros e dos povos originários. Essa é a nossa marca histórica e o poder sistêmico aqui sempre foi sustentado na violência ilimitada. Por exemplo, quando é que não teve tortura e assassinatos sistemáticos no conflito social do Estado contra certos grupos sociais e étnicos aqui no Brasil? Nunca. E várias outras formas de violência opressiva são aceitas naturalmente, são naturalizadas, aqui no Brasil, desde sempre. E é por isto que eu posso dizer que sempre fomos fascistas. E foi por isto que eu votei e fiz propaganda e me emocionei nessa eleição e estou aqui agora elogiando o Lula e o PT, sendo o velho anarquista que eu sou. Por que pode-se chegar ao anarquismo, teoricamente, ideologicamente, pela via da crítica ao Estado ou pela via da crítica ao Mercado e só se chega ao anarquismo, à teoria ou ideologia, verdadeiramente anarquista, quando, no extremo de uma crítica parcial, ao Estado ou ao Mercado, atinge-se a crítica simultânea de ambos, de Mercado e Estado. Mas o caminho real para a anarquia na realidade objetiva não pode ser o caminho liberal, pois este caminho é destrutivo a um nível insuportável para as nações e para a humanidade. É grande demais toda a destruição e o custo histórico que têm as grandes crises econômicas e as guerras, que surgem necessariamente em ciclos, episódicos, na economia e na geopolítica capitalista. Estamos agora em condição de ver historicamente esta questão de um prisma único após o imenso sucesso do socialismo chinês nos últimos 40 anos ou mais. Então já fica claro que não precisamos mesmo passar ou continuar passando pelos ciclos destrutivos extremos da sociedade capitalista e nem resolver as coisas pela guerra. E foi por tudo isto que eu votei de novo e fiz propaganda eleitoral e tudo. Não posso querer mais do que apenas isto. Não vamos mais no caminho do arrocho sobre os mais pobres e os trabalhadores em geral, nem do desmonte dos serviços públicos para a população. Não vamos mais no caminho do desmatamento da amazônia e da destruição do meio ambiente em geral. Não vamos mais no caminho da violência como solução para os conflitos sociais. Mas agora não dá para ser no ritmo que as coisas aconteceram nos governos anteriores. Temos que acelerar de modo Chinês. Aliás, é principalmente com eles que a gente deve contar mesmo. Não podemos ter medo de nos aproximarmos estrategicamente e em todos os aspectos daquele que já é o nosso maior parceiro econômico. Esse é o caminho estreito mas sem tanta destruição e sacanagem como foi até agora nosso caminho sob os imperios de Portugal, Inglaterra ou Estados Unidos. A proposta da China é sempre de ganha ganha e de respeito à autonomia dos povos. Vamos ficar com esta base, por enquanto, ela é suficiente. Nosso caminho é democrático, Essa foi aliás, a escolha histórica que deu origem ao PT. Uma perspectiva de socialismo democrático em um país de extração colonial. Novidade histórica e estamos vivendo este caminho estreito, mas pelo menos agora, fizemos a escolha certa novamente. Por estreita margem e dentro de dificuldades sistêmicas muito grandes. Para simplificar e encerrar este texto, estamos na transição final do poder central ou polo de direcionamento maior da humanidade dos EUA para a China e, com isto, também na transição ou em um avanço a mais do socialismo mundial. Esta transição, como todas nesta dimensão, é carregada de tensões e dificuldades que facilmente desembocam em guerras. Mas a China é diferente dos EUA e o socialismo é diferente do capitalismo liberal. Agora podemos dar mais um passo no rumo certo também aqui no Brasil, dentro dessa estrutura de forças muito tensionada, quando justamente o pêndulo histórico que veio ao extremo do liberalismo, com suas grandes crises econômicas, seu fascismo, suas guerras, agora já está se revertendo no sentido do socialismo e da paz. E é neste movimento do pêndulo histórico mundial para o socialismo e a paz que a vitória do Lula pode ser percebida em sua maior relevância. Demos força a este movimento mundial e podemos estar contribuindo para abreviar e reduzir não apenas a miséria e a opressão no Brasil, mas também a destruição e a guerra capitalistas no mundo todo. E foi por isto que eu, anarquista que sou, votei com o Lula, depois de mais de 30 anos sem votar. E fiz campanha até onde eu pude também. Este é o melhor caminho. E precisa ser reconstituído. A ascensão do fascismo ao poder político no Brasil sempre tem o efeito pedagógico de nos mostrar como ele sempre foi e continua largamente disseminado e é prevalente em nossa sociedade. Acabar com o fascismo no BR não é apenas tirar o Bolsonaro da presidência e meter ele, seus filhos e toda a quadrilha de milicianos que os cerca e que matou a Mariele, por exemplo, na cadeia. Isto é certo, mas se não acabar com as torturas e mortes, com as chacinas e com o uso sistemático de violência como forma de poder e dominação no dia a dia, então o fascismo continuará vivo e predominando na nossa sociedade. É por este efeito pedagógico que eu sempre digo que sempre que a serpente do fascismo levanta a cabeça ela tem que ser decepada ou esmagada. Todas as vezes de novo. Agora já sabemos que a cabeça da serpente está em Bolsonaro e no poder miliciano, no campo e nas cidades, mas também sabemos que ela está, e quase sempre esteve mesmo, no controle político dos órgãos de classe e categorias profissionais do nosso país, assim como no controle econômico e ideológico de grande parte da imprensa, das redes sociais, das empresas, e igrejas no nosso país. Sim sabemos, sempre soubemos, que a doutrina dominante nos níveis de poder em grande parte destes setores é fascista. São pessoas abertamente a favor da opressão de minorias e do uso ilimitado e sem controle legal da violência dos poderosos no exercício da opressão. São pessoas que defendem e se posicionam aberta ou veladamente pela exploração e opressão sem limites sobre a base social e os grupos excluídos ou marginalizados aqui no nosso país. Ou são o poder dominante nas direções políticas e ideológicas nestes setores ou têm livremente espaço de voz e de disputa política nestes setores e instituições. Mas o fascismo não pode ser admitido para a disputa democrática e legítima em nenhum setor da nossa sociedade. Por exemplo, aceitar e incentivar uma polícia fascista, torturadora e assassina e o uso da violência armada pelos poderosos é algo que não pode ocorrer em nenhum fórum de uma sociedade democrática. Os fascistas e o fascismo têm que ser derrotados em todos os âmbitos sociais. E foi por isso que eu votei e fiz campanha para o Lula e o PT. Com tranquilidade e muita apreensão, mas sabendo que não fui omisso e nem comunguei com os fascistas e o fascismo jamais. Sempre com muito receio de que não conseguiríamos derrotar a compra de votos e o sistema de opressão, a máquina de poder e coação que os poderosos puseram em movimento de todas as maneiras nesta eleição. E, é óbvio, vão tentar ainda algumas coisas, mas não vão barrar a mudança. Essa pequena inflexão nós já conquistamos. E vamos adiante, com nossos corpos e sonhos, como se dizia antigamente.

terça-feira, 4 de outubro de 2022

A eleição do governador do Rio tem algo a dizer


 Ele promoveu as maiores chacinas da história da cidade e foi eleito por isto.


Só pode haver uma razão para a maior parte dos eleitores fazerem esta escolha. A situação de violência, insegurança e medo cotidianos está em um nível tão absurdo que uma grande parte das pessoas sentem essas mortes em massa como algo positivo.


Elas sentem que a imposição de força pelo Estado, sem limite e sem lei, é melhor do que a imposição de força sem limite e sem lei por parte do crime.


Tem uma realidade muito miserável com um apelo emocional muto forte aí, mas também tem uma doutrinação ideológica constante, para que isto aconteça.


Parece que estas pessoas ignoram que a morte de índios, negros e favelados sempre foi uma estratégia política adotada aqui no Brasil. E parece que elas ignoram também que essa imposição de força sem limite e sem lei pelo Estado simplesmente não dá certo. Naquele mesmo local onde houve qualquer chacina destas e na cidade e no estado inteiros, as condições de violência, insegurança e medo vão continuar iguais eram antes. Chacinas já foram dezenas, centenas, já houve intervenção das forças armadas, torturas e mortes sem julgamento, assassinatos, portanto, são cometidos diariamente pelas forças policiais do Estado. E nada disto resolve.

Mas o povo, em maioria votou por mais disto.

E não vai dar certo de novo.


A esquerda parece que não tem nenhuma resposta a este estado de medo que a violência criminal e sua manipulação política e ideológica geram. As argumentações de legalidade e direitos humanos e as propostas de desenvolvimento social soam para a população, em estado de pânico manipulado política e ideologicamente, como defesa dos bandidos e complacência com o crime.


Ao ponto da esquerda terminar jogando no campo do adversário e se vendo aprisionada pela visão conservadora e fascista, onde ela só poderá perder.


Seja pela realidade ou pelo imaginário popular a questão da violência no Brasil e especificamente no RJ está ligada à questão das drogas.


E quem está no campo onde eu me encontro sabe bem do caráter opressor, discriminatório, abusivo e letal que o Estado costuma ter, sob a bandeira da política antidrogas. Eu sei, nós sabemos, que a chamada guerra às drogas é uma política fascista, sob alegações falsas de saúde pública e proteção das famílias. Não é com a violência policial, muito menos com a violência policial sem lei e sem limites, que podemos equacionar bem a questão das drogas para a saúde pública e para a segurança das famílias.

Mas parece que esta questão, pelo caráter emocional, pelo estado de pânico até, em que ela é constantemente tratada, torna-se um verdadeiro tabu, uma verdadeira kriptonita eleitoral.

Sorte que eu não sou candidato a nada e posso falar a verdade, sem me preocupar com a reação da população assustada.


Sim meus amigos, não há razão de saúde pública ou de segurança pública ou das famílias que justifique criminalizar as drogas. Pra começo de conversa, poucas drogas são mais perigosas do que o álcool e a nicotina. Poucas drogas podem provocar mais dano à saúde e à vida social e econômica das pessoas e das famílias do que o álcool e a nicotina. E com certeza a própria guerra às drogas provoca mais mortes e destruição de famílias do que aquelas que ela busca evitar. E não funciona.


Quando se fala que a questão das drogas é uma questão de saúde pública esta é uma verdade que não pode ser ignorada. De saúde pública, de saúde mental e de assistência social. Todo mundo que lida com dependentes químicos sabe disto. Criminalizar as drogas só aumenta a violência e dificulta os tratamentos.


A manipulação política e ideológica desta questão se dá de forma massiva e constante nos programas policiais disseminados pelas TVs e rádios de todo o país. Eles incentivam, diretamente ou veladamente, o ódio social e a violência policial. E também nas redes de mídia religiosa que também são totalmente disseminadas e fortemente incentivadas pelo poder público em todo o país.


Essa mídia e essa ideologia são amplamente difundidas se tornam prevalentes justamente em condições de violência e medo altos. Temos verdadeiros ciclos viciosos aí. Porque esta mídia se nutre, justamente, da violência e do medo. E, além destes ciclos viciosos da mídia, temos também os ciclos viciosos objetivos em que boa parte destes propagandistas antidrogas são usuários de drogas, assim como boa parte da polícia e do judiciário. Quem faz propaganda contra, quem prende e mata e quem condena. Boa parte é usuária de drogas proibidas. E boa parte está diretamente envolvida com o tráfico de drogas.


A guerra às drogas não funciona e nunca vai funcionar.


Ver uma esquerda progressista ou uma direita liberal defendendo isto é algo que me faz suspirar profundamente e firmar minhas forças porque sei que a batalha é grande e longa ainda. E no seu curso várias prisões, internações forçadas, torturas e outras formas de violência, mortes e chacinas desnecessárias vão continuar a acontecer.


Mas de alguma forma as sociedades humanas desenvolvem e fazem criticas dos seus erros e o futuro vem, por mais que os tabus e medos tentem impedir

sábado, 1 de outubro de 2022

QUEM SÃO OS FASCISTAS E PORQUE ELES TÊM QUE SER DERROTADOS


Nesta campanha eleitoral e na anterior bloqueei e desfiz amizade com algumas pessoas. Infelizmente, não era a minha intenção, mas fazer propaganda para o fascismo excede os limites do aceitável para mim.


Fico triste, mas não tem outro jeito. Com o fascismo não se dialoga.


Penso especialmente em uma pessoa específica e acredito que ela não aceitaria esta classificação de fascista.


Mas já tem muita coisa evidente no discurso e nas práticas dos Bolsonaro e dos grupos que subiram ao poder com eles. Mesmo para quem não quer ver.


Enfim há uma origem miliciana e ligada à ditadura militar e ao que há de pior nela: o terrorismo de estado. O uso da tortura e dos assassinatos como armas políticas. E isto tudo é fascismo político. Poder militar e violência armada como estratégia de poder.


Eu entendo que a coisa colocada assim no nível político é abstrata e dá margem a dúvidas.


Mas isto faz parte do nosso dia a dia.


Há uma violência constante, da sociedade e do Estado, atingindo focalizadamente pobres, negros, índios, homossexuais, pacientes psiquiátricos, pessoas com deficiência, mulheres, idosos, crianças, entre outros grupos excluídos ou fragilizados, que são alvo de níveis diversos de violência opressiva da sociedade e do Estado. E há, aqui no Brasil, uma verdadeira guerra aberta de grupos dominantes e do Estado, baseada em violência física, torturas e assassinatos, contra alguns destes grupos oprimidos. A violência armada é estratégia constante do poder dominante no Brasil, desde sempre. Desconhecer isto é uma ignorância absurda. Ser conivente com isto é inaceitável.


Mas eu não tô escrevendo isto apenas pra me justificar, pra explicar porque eu desfaço as amizades neste caso, mas principalmente para tentar entender o que leva alguém com tantas qualidades pessoais e digna de respeito a se aliar a esta ideologia ao ponto de fazer propaganda para o presidente fascista?


Bom, acredito que o ambiente ideológico midiático, digamos assim, conta muito. E este é predominantemente fascista, ou, pelo menos, bastante conivente com o fascismo e vinculado à religião aqui no Brasil. Os assassinatos contra os índios, nas ocupações e favelas e até mesmo contra ecologistas raramente ganham a projeção e a condenação que mereceriam na mídia nacional. Ao contrário, no dia a dia, estas mortes e até mesmo as torturas e os estupros de adolescentes e crianças, são minimizadas, completamente desconsideradas e até mesmo incentivadas, de modo direto ou através de indiretas. Somos continuamente doutrinados, direta ou subliminarmente, a aceitar isto como natural ou inevitável. Cria-se, nas culturas locais onde estes conflitos estão presentes, com grande peso da mídia, um verdadeiro ciclo vicioso de exclusão, abusos, miséria e violência que parece fazer parte da própria condição nacional aqui no Brasil. De algum modo, parece natural para estas pessoas que aqui no Brasil a questão da propriedade e uso da terra, e, por derivado, todas as questões de propriedade ainda tenham que ser cotidianamente resolvidas e impostas na bala. E sempre, nesta visão, por culpa dos grupos oprimidos, nunca dos opressores. Ao ponto de, por fim, parecer justo a estas pessoas que justamente os oprimidos de sempre sofram ainda mais violência. E é por isso que elas aderem ao fascismo e é por isto também que o fascismo é uma face dominante da nossa cultura, de forma mais ou menos explícita, mais oculta ou mais manifesta, no plano político partidário.


Sou capaz de entender também que há uma apelo especial do fascismo ao extrato social médio em busca de ascensão econômica, social e política. É bem possível entender que haja uma adesão forte, especialmente dos empreendedores neste grupo social, à ideologia do livre mercado e até mesmo à imposição, pela força, de limites estreitos para a renda dos trabalhadores. E, novamente, essa ideologia é dominante aqui no Brasil, de um modo ou de outro, desde sempre e, por isso mesmo, também cria-se, no Brasil, essa cultura, fascista, de pobreza e violência, como um ciclo vicioso. É preciso, nesta ideologia e na sua prática objetiva, que os salários dos trabalhadores, que a renda direta e os direitos e ganhos associados ao trabalho, tenham que ser mantidos nos níveis mais baixos o possível, mesmo abaixo do nível mínimo de dignidade humana, pois é sobre esta base que eles acreditam que a economia brasileira deve funcionar e que apenas assim ela será exitosa. A manutenção da população trabalhadora em condições de pobreza e miséria e na ausência de direitos e serviços compensatórios só pode ser feita pela força, pela violência e pela imposição do medo sobre a população trabalhadora e sobre os grupos sociais excluídos e oprimidos, ou seja, pelo terrorismo de Estado fascista. E é por isto também que estas pessoas aderem ao fascismo e que a gente deve entender que o fascismo sempre foi e continua sendo uma força dominante na nossa sociedade.  É esta "necessidade econômica" que impõe o próprio fascismo político aberto e o estado de exceção como necessários para o país, de tempos em tempos.


Mas, enfim, o que eu penso ser, hoje, o mais importante, para esta pessoa específica e, talvez, para a grande maioria dos eleitores e propagandistas do fascismo no Brasil, é o seu vínculo com a religião. Eu acredito que o apelo religioso, a reafirmação, sem limites, da ideologia religiosa é a grande força psicológica do fascismo, especificamente aqui no Brasil hoje. E é bastante óbvio, para mim, que, no que realmente importa, no que realmente move a vida e as escolhas das pessoas, essa ideologia religiosa é, como ela mesma se afirma, uma ideologia de defesa da família. É este o centro objetivo, verdadeiro ou prático de toda a ideologia religiosa. E é objetivamente neste sentido que ela é utilizada como arma ideológica do fascismo. Através da identificação aberta com a religião, aqui entre nós, com a religião cristã, o fascismo se afirma como a expressão política da ideologia de defesa da família. É o valor superior da família que mexe com o psicológico dessas pessoas ao ponto delas aderirem ao fascismo e endossarem a violência armada e o terrorismo de Estado como estratégia legítima do poder. O amor à família as torna defensoras da tortura e assassinato de opositores do sistema. A barbárie é afirmada em nome do amor. Não é a primeira vez que o cristianismo cumpre este papel no jogo ideológico ao longo da história. E certamente não vai ser a última.


É necessário aprofundar todas estas análises, especialmente o vínculo do fascismo, ao fim, com a ideologia de defesa da família. Mas não agora.


Enfim, sejam quais forem as razões que levam alguém a aderir ao fascismo, sejam elas conscientes ou não, isso será sempre inaceitável para mim. Como eu digo sempre, toda vez que a serpente do fascismo levanta a cabeça, ela tem que ser esmagada. Isso quer dizer que não se pode negociar com a ideologia fascista. Ela tem que ser abominada e destruída, como perversão e crime contra a humanidade que é. Não estou falando de violência contra as pessoas, mas também não estou falando de ser conivente com qualquer pessoa ou ambiente em que se divulgue ou faça propaganda do fascismo. E é por isso que eu desfaço amizades e dou bloqueios de quem faz propaganda de políticos fascistas.

domingo, 14 de agosto de 2022

EPIDEMIOLOGIA DA MORTALIDADE DA COVID

Epidemiologia da Mortalidade por Covid até Agosto de 2022


Assim que a epidemia de Covid surgiu, em fins de 2019, início de 2020, na China, e iniciou a sua disseminação mundial, surgiu também a ideia, logo amplamente acatada no mundo ocidental, de que, antes da vacina,

a principal forma de se prevenir a propagação da doença e seu rastro trágico de mortes, seria o isolamento social.

Essa ideia foi difundida como uma verdade cientificamente comprovada, especialmente a partir de uma publicação do Imperial College of London (Report 9: Impact of non-pharmaceutical interventions (NPIs) to reduce COVID-19 mortality and healthcare demand - Março, 2020), bem no início da pandemia e foi progressivamente adotada, de um modo ou de outro, pelos países ocidentais em geral.

Como afirmam os autores de artigo atual sobre o tema, no Brasil:

“Desde o início da pandemia, as autoridades de saúde pública do Brasil recomendam a adoção de medidas para evitar a propagação do vírus, como o distanciamento social, isolamento dos casos confirmados da doença, higiene das mãos e uso de máscaras. Porém, a principal estratégia para diminuir o número de casos e mortes pela Covid-19 foi o fechamento total ou parcial de locais que reuniam um grande número de pessoas, tais como escolas, estabelecimentos comerciais considerados não essenciais, fronteiras e cancelamento de eventos públicos”. (Adesão ao isolamento social na pandemia de Covid-19 entre professores da educação básica de Minas Gerais, Brasil – Saúde e Debate, Março, 2022).

Deve-se destacar que nos países do mundo ocidental, Europa e Américas, em geral, essas medidas de isolamento social, representando uma quarentena generalizada, de praticamente toda a população do país, foram recomendadas e sua implantação foi de fato tentada, sem prazos definidos, ou seja, por período indefinido, até que se tivesse vacinação em massa contra a doença.

Deve-se destacar também que entre as medidas citadas pelos autores no trecho acima, como recomendadas pelas autoridades no Brasil, não consta a testagem em massa. Não consta a testagem, de modo algum. E isto não é um lapso imperdoável dos autores. Infelizmente, é muito pior. Este foi um erro estratégico real das autoridades de saúde pública no nosso país. Não houve, é claro, nenhuma estratégia de testagem implantada no Brasil, nem a nível nacional nem em outro nível populacional qualquer.

Parece razoável concluir, aliás, que a negligência com relação à importância da testagem na estratégia de prevenção foi estimulada, ou até em parte determinada, pela estratégia de isolamento social geral, de quarentena generalizada por tempo indeterminado. A estratégia de testagem parece mesmo menos importante se realmente tivermos um isolamento geral. Não é de se estranhar que o referido artigo referencial do Imperial College, por exemplo, não faz uma mínima consideração sobre o impacto potencial da testagem em massa como estratégia central na prevenção da epidemia.


A adoção destas medidas de isolamento social, ou quarentena generalizada, em um país, por tempo indefinido como o eixo ou núcleo de toda a estratégia, ou, pelo menos como a medida principal, para o controle da epidemia antes da vacinação em massa, tinha dois ou três pressupostos que devem ser considerados:
1. Essas medidas seriam efetivas para a prevenção da epidemia. Isto quer dizer, que elas seriam aplicáveis na realidade e teriam os efeitos esperados.
2. O dano potencial ou real provocado pela epidemia superaria, em muito, o dano causado por estas medidas de isolamento por tempo indeterminado

3. Essas medidas de isolamento social seriam as únicas, as essenciais, ou, pelo menos, seriam muito mais eficazes do que quaisquer outras que pudessem ser adotadas em seu lugar.

Na verdade esses pressupostos da proposta foram assumidos imediatamente ou progressivamente como certezas cientificamente comprovadas. Apesar de não se ter objetivamente quase dado algum para sustentar estas certezas. E apesar de até mesmo a OMS indicar, ainda no início da pandemia, a testagem como o centro de qualquer estratégia de prevenção.

Na época parecia impossível, e ainda hoje talvez seja, alguém se contrapor a estas certezas midiáticas. Ainda mais pelo caráter político ideológico que elas tomaram na ocasião, sob o impacto aterrorizante de um crescente de mortes causadas pela epidemia. Por motivos que não cabe avaliar agora, apenas a direita e até mesmo apenas a extrema direita combateu diretamente o isolamento social no mundo ocidental. E quem, de outro matiz ideológico também se contrapôs, foi taxado como fascista, na ocasião. Mas agora já temos um conjunto de dados de realidade de mais de dois anos e meio de pandemia, com realidades completamente diferentes entre os diversos países no mundo. Talvez a gente consiga olhar para estes dados com a intenção investigativa e simplesmente perguntar o que eles nos dizem.

Os objetivos das medidas de prevenção eram basicamente diminuir a transmissão e assim o número de casos novos e mortes. Não podemos considerar os dados de números de casos como definidores para a avaliação do impacto de qualquer medida de prevenção neste caso, porque os recursos e as formas de diagnóstico e testagem foram e são muito diferentes nos diversos países mundo afora. Parece mais razoável nos fiarmos nos dados de mortalidade, mais seguros e definidores, de fato, do impacto final da pandemia, ainda que também com um bom potencial de questionamento e divergências.

Por isso concentro a análise abaixo apenas nos dados de mortalidade.

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Desde o início da pandemia, até 13 de Agosto de 2022, ou seja, em mais de dois anos, o número total de mortes associadas à COVID no mundo foi de 6,4 milhões (Fonte: Johns Hopkins Coronavirus Resource Center). Ou seja, menos de 3,2 milhões por ano. Isto é bastante similar ao total de mortes que ocorrem todos os anos por pneunonia. E está vários milhões abaixo das mortes anualmente causadas por Infarto ou derrame (mais de 10 milhões cada).

A população mundial é hoje de 7.9 bilhões de pessoas. A taxa de mortalidade associada à COVID é, foi, portanto, menor que de 0,4 / 1000 pessoas por ano.

Já o total de mortes anuais é de 60 milhões em todo o mundo e, portanto, a taxa de mortalidade geral no mundo é próxima a 8 / 1000.


Estes são os dados e a realidade no mundo após 30 meses da pandemia.

O seu impacto, sintetizado na mortalidade, é equivalente àquele que ocorre anualmente causado pela pneumonia e várias vezes menor do que aquele causado todo ano pelas doenças cardiovasculares.

O que essa informação nos serve é para pensar se diante deste risco, do risco deste dano, as medidas de quarentena generalizada por tempo indeterminado seriam justificáveis. Avalie por você mesmo.

Duas informações adicionais devem ser contrastadas com essa para que se possa fazer uma boa avaliação realmente.

Primeiro é o custo social, humano, econômico, de saúde e para a vida das pessoas em geral que estas medidas impuseram. A quebra de cadeias produtivas, a recessão generalizada, o desemprego, os aumentos da pobreza e da miséria, a perda educacional, as descontinuidades e atrasos em diversos tratamentos, as rupturas sociais e o sofrimento psíquico etc. Os danos causados pela pandemia e os seus riscos, eram ou foram ou ainda são, tão maiores que estes do isolamento social generalizado por tempo indeterminado, de modo a justificá-los? Ou estas medidas de fato causaram e causam mais danos do que benefícios?

A segunda informação ou questão que deve ser considerada é qual a efetividade real das medidas de isolamento assim adotadas? Qual terá sido o real impacto destas medidas na disseminação da doença? Qualquer um que esteve no Brasil ou na Índia, ou em algum país da Europa nesta época, pode, com certeza, indicar um grande conjunto de falhas nas medidas de isolamento social em seu país. Falhas graves, continuadas e reiteradas que comprometeram de fato o isolamento social no país, constantemente. Mas, mesmo assim, acreditam piamente que o isolamento foi o fator mais importante para a prevenção da propagação da epidemia. Argumenta-se, portanto, que uma mortalidade maior foi evitada pela estratégia de isolamento social generalizado até a aplicação em massa das vacinas. Mesmo com tantos furos e a virtual impossibilidade de uma boa aplicação desta ideia na prática, o isolamento generalizado, a quarentena de toda a população, por tempo indeterminado, até a vacinação, foi difundida e adotada, em países ocidentais, na Europa e nas Américas, como a firme posição científica sobre a questão e, na medida em que foi aplicada, deve ter reduzido de algum modo a mortalidade pela epidemia.


A mortalidade é, com certeza, uma expressão sintética destes resultados, onde a prevenção foi mais efetiva a transmissão deve ter sido menor e a mortalidade também, consequentemente.

Contudo, quando olhamos para a epidemiologia desta mortalidade, em sua distribuição por países, não parece haver a menor consistência na ideia de que estas medidas impactaram de modo realmente efetivo a epidemia no mundo.


Considerando-se os 30 piores desempenhos neste indicador a gente vê o seguinte retrato

COUNTRY

DEATHS/100K POP.

Peru

651,74

Bulgaria

539,47

Hungary

486,17

Bosnia and Herzegovina

485,92

North Macedonia

451,86

Montenegro

439,13

Georgia

423,07

Croatia

401,24

Czechia

379,44

Slovakia

372,35

San Marino

347,69

Romania

344,69

Lithuania

339,05

Slovenia

324,35

Brazil

320,50

US

314,75

Chile

313,50

Latvia

313,28

Poland

308,48

Greece

304,34

Armenia

291,47

Trinidad and Tobago

290,89

Moldova

289,55

Italy

287,54

Argentina

286,40

Belgium

281,61

Colombia

277,67

United Kingdom

275,16

Paraguay

271,39

Ukraine

266,40

Fonte: Johns Hopkins Coronavirus Resource Center


O que me chama mais a atenção neste grupo de piores resultados é:

A presença de países da Europa e Américas, exclusivamente.

A grande presença de países ricos, com alta renda per capita e melhores serviços de saúde em geral.
A presença de vários países da América do Sul.
Uma grande concentração de países do Leste Europeu no pior nível.
Os resultados do Brasil, entre os piores do mundo e muito próximos daqueles dos EUA.

Não parece razoável atribuir às medidas de isolamento social um peso predominante no pior desempenho destes países. Ainda que, até tautologicamente, em condições iguais, onde a prevenção foi pior realizada os resultados devem ser piores.

O que se pode dizer, com boa dose de certeza, é que este grupo de países não se destaca negativamente por terem negado a estratégia de quarentena generalizada com isolamento social por tempo indeterminado. Ao contrário, parece que a maioria destes países tentou, de um jeito ou de outro, justamente, a prevenção da pandemia através desta estratégia.


Considerando-se 30 países com resultados medianamente satisfatórios

Sri Lanka

77.59

Belarus

75.33

Cuba

75.30

Cabo Verde

73.74

Norway

70.72

El Salvador

65.01

Mongolia

64.76

Iraq

62.96

Kuwait

59.99

Indonesia

57.47

Maldives

56.79

Philippines

55.62

Iceland

52.45

Brunei

51.43

Australia

50.35

Korea, South

49.87

Kyrgyzstan

45.84

Thailand

45.56

Vietnam

44.27

Morocco

44.07

Nepal

41.13

Dominican Republic

40.41

Taiwan*

39.35

India

38.19

Zimbabwe

37.59

New Zealand

36.31

Burma

35.72

Sao Tome and Principe

34.68

Palau

33.32

Lesotho

32.86

Fonte: Johns Hopkins Coronavirus Resource Center


Chama a atenção a imensa distribuição geográfica destes países de resultados medianos, um pouco abaixo do resultado mundial global de 80 óbitos por 100 mil habitantes, desde o início da pandemia.

Novamente é muito difícil e, provavelmente falseador, tentar atribuir estes resultados predominantemente à estratégia de quarentena generalizada com isolamento social por tempo indeterminado, até a vacinação.
Ao contrário é possível identificar neste grupo estratégias bem divergentes, com relação ao isolamento social. A Nova Zelândia foi reconhecida como exemplo de estratégia de sucesso baseada no isolamento social generalizado e por tempo indeterminado, ao passo que para países como a Islândia, Belarus, Índia, Vietnã, por exemplo, não parece justo dizer que a estratégia central de prevenção foi esta.


Considerando-se os 30 países com os melhores resultados

Sudan

11.31

Kiribati

11.05

Kenya

10.55

Laos

10.40

Timor-Leste

10.24

Guinea-Bissau

8.84

Somalia

8.56

Uganda

7.93

Papua New Guinea

7.41

Haiti

7.35

Cameroon

7.28

Yemen

7.22

Mozambique

7.10

Congo (Brazzaville)

7.00

Ethiopia

6.58

Angola

5.83

Liberia

5.81

Madagascar

5.09

Uzbekistan

4.89

Vanuatu

4.78

Ghana

4.69

Nicaragua

3.68

Mali

3.65

Guinea

3.40

Togo

3.39

Cote d'Ivoire

3.09

Eritrea

2.90

Bhutan

2.72

Central African Republic

2.34

Burkina Faso

1.85

Sierra Leone

1.58

Congo (Kinshasa)

1.55

Nigeria

1.53

Tanzania

1.41

Benin

1.34

Tajikistan

1.31

Niger

1.28

South Sudan

1.23

Chad

1.17

China

1.05

Burundi

0.32

Korea, North

0.02

Fonte: Johns Hopkins Coronavirus Resource Center


Quando se chega aos melhores resultados, novamente não parece que estes resultados devam ser atribuídos a uma adoção especialmente bem realizada da estratégia de quarentena generalizada com isolamento social, por tempo indeterminado.

Chama a atenção a grande concentração de países da África, com alguns poucos países do Oriente e menos ainda da América. E chama atenção também o excelente resultado da China.

Com certeza não se pode atribuir os melhores resultados neste grupo às medidas de isolamento social que eles teriam implantado e executado melhor do que os outros durante a pandemia, até hoje. Com certeza não foi este o fator predominante da grande presença de países africanos nem dos excelentes resultados da China. Ainda que a China tenha o padrão mais rigoroso de controle da pandemia (O Covid zero, criticado pelo mundo ocidental e pela própria OMS), ele não foi baseado em quarentena generalizada com isolamento social nacional por tempo indeterminado. Não, ele foi baseado em testagem em massa, identificação e isolamento precoce de casos, rastreio de contatos, controle rigoroso de alfândega e lockdowns isolados em bairros ou cidades. Essa metodologia, por mais criticável que seja, e eu sou crítico a ela também, foi, é muito mais efetiva e com muito menor custo do que aquela preconizada e adotada no mundo ocidental.

Pode-se criticar as análises acima indicando que eu estaria comparando coisas diferentes, pois as realidades sociais, demográficas e étnicas seriam muito diferentes nestes diversos países. E poderíamos também levantar várias hipóteses sobre o impacto de cada uma destas diferenças nos resultados.
Mas tudo isto só reforça a minha tese de que, ao nível de países, não se tem evidência empírica suficiente para se atribuir benefício real na prevenção à pandemia pela adoção das medidas de isolamento social (quarentena generalizada) por tempo indeterminado.

Talvez alguém considere ainda que o melhor seria comparar unidades menores, como cidades ou pequenos territórios que implantaram medidas de isolamento social com outros que não implantaram. Mas, é acertado considerar estes dados ao nível de país, pois, esta é a unidade política em que as medidas do nível das discutidas aqui são tomadas e a unidade populacional em que elas de fato se aplicam. Logo a sua aplicabilidade real, os seus efeitos práticos na prevenção da doença e o seu custo social real, devem mesmo ser medidos ao nível nacional. É possível, por exemplo, que medidas muito bem implantadas e efetivas em um pequeno território se mostrem inviáveis e por isso inefetivas em unidades territoriais e populacionais maiores.

E os dados epidemiológicos, de mortalidade por países, parecem indicar mais o sentido contrário.

Em geral, países que se concentraram nesta estratégia de isolamento social como centro ou núcleo de suas medidas preventivas tiveram os piores resultados (mais altas taxas de mortalidade). A estratégia clássica de testagem em massa com localização e isolamento de positivos e investigação de contatos parece estar associada aos resultados mais positivos (mortalidade menor do que a global). Também parece claro que a associação dessa estratégia com o controle de alfândega e com os lockdowns em territórios delimitados (bairros ou cidades) por tempo limitado (semanas) foi mais bem sucedida do que o isolamento generalizado por tempo indeterminado e com custo social, humano, muito menor.


terça-feira, 19 de julho de 2022

O MOVIMENTO PENDULAR DA ECONOMIA CAPITALISTA E O MOMENTO HISTÓRICO ATUAL

 Eu tive uma primeira intuição do movimento pendular entre liberalismo e socialismo, digamos assim, para simplificar, dentro do capitalismo contemporâneo, no início da década de 80. Quando me pareceu claro que as estruturas econômicas (inter)nacionais e sociais democratas, que tinham ganhado corpo no pós guerra e dado forma à economia mundial desde então, haviam se tornado relativamente obsoletas e se tornado em empecilhos ao avanço do desenvolvimento econômico (sociotecnológico) mundial.

Uma necessária onda liberalizante vinha para dar alguma correção a isto.
Eu via claramente, naquela época, que a globalização era uma necessidade econômica incontrastável e que as forças que se opunham a ela seriam vencidas. E foi o que aconteceu, ainda que hoje, em aparente paradoxo, as forças liberais que conduziram a globalização, lutem contra ela.
O liberalismo venceu naquele momento histórico e muitas barreiras nacionais e sociais democratas foram superadas, em meio a um novo salto tecnológico e econômico mundial que veio até a primeira década do atual século. De lá para cá este ciclo chegou ao nível de uma crise estrutural de grandes proporções. Na qual estamos atualmente.
Na minha análise essa grande crise estrutural era, também, previsível, já que na essência do modelo de desenvolvimento liberal a concentração de riquezas surge como um resultado necessário e um verdadeiro princípio inconteste. E a concentração acentuada das riquezas leva a dificuldades crescentes para a realização do capital e, portanto, para o desenvolvimento capitalista.
Desta crise e por esta razão deverá resultar um novo ciclo, um novo movimento do pêndulo, desta vez, como nos anos que se seguiram à grande crise do século passado, o movimento no sentido socializante. No sentido do socialismo. É a resposta correta e necessária à crise capitalista. Aumentar o controle público e as medidas socialistas de proteção social e universalização dos serviços vitais para as populações.
Mas, a cada momento deste movimento histórico, a superação do processo de crise econômica estrutural do capitalismo vem acompanhado de muito estresse social e político, destruição econômica, muita dor e sofrimento humanos. É só a custa destas desgraças que o sistema reage mudando o seu rumo.
Na tradição histórica temos os seguintes problemas diretamente oriundos da crise econômica capitalista e de suas consequências imediatas: o crescimento do desemprego, quebras generalizadas em setores da economia, perda de renda e da capacidade de compra, aumento da pobreza e da miséria. No curso da história contemporânea já desenvolvemos, é claro, todo um sistema de mecanismos econômicos anticíclicos e de proteção social para lidar com estes problemas e suas consequências. Mas, no fim de um verdadeiro ciclo liberal estes mecanismos não são suficientes para conter a crise. Ela estala e arrasta tudo ao seu redor em sua sanha destrutiva. Muitas atitudes que seriam consideradas completamente irracionais e inaceitáveis em outro momento, dado o seu caráter destrutivo, para a economia e até diretamente para a vida de milhares e milhões de pessoas, se tornam aparentemente necessárias ou inevitáveis em grande escala, em escala global.
É isto o que estamos vivendo hoje. Os sistemas de regulação econômica e proteção social certamente têm impedido um mal muito maior do que seria se ainda não tivéssemos esses recursos sociais democratas desenvolvidos e historicamente testados. Haveria muito mais fome, miséria e servidão humana no mundo, como foi, por exemplo no início do século passado. Mas, está claro, agora, que os recursos socialistas já desenvolvidos e após submetidos ao impacto das décadas de liberalismo, não são capazes de barrar o vetor destrutivo da grande crise em que estamos metidos. As loucuras como aquelas do combate à pandemia e aquelas da guerra são chamadas ao grande palco mundial. E aquilo que em qualquer outro momento pareceria uma completa estupidez passa a ser considerado uma necessidade racional.
No que toca à resposta à pandemia, eu percebi desde o princípio a irracionalidade da ideia que foi vencedora no mundo ocidental, em geral, de fazer-se uma quarentena generalizada, de toda a população, por tempo indefinido, até se conseguir o controle da epidemia, provavelmente com a vacinação. Esse delírio completo foi então considerado como alta racionalidade científica e continua sendo. Mas, em geral, deu errado pra todo lado onde foi implantado. Não impediu a disseminação da epidemia e quebrou a economia. Deu errado porque a sua implantação efetiva era praticamente inviável e porque seus resultados acrescentavam perdas sociais imensas ao drama da epidemia e suas consequências. A estratégia correta teria que ser baseada na realização em massa e reiterada dos testes para a identificação de contaminados e sua rede de contatos e as medidas de isolamento e proteção consequentes, como mandaria qualquer manual de vigilância epidemiológica. Mas, nessas situações, a simples racionalidade perde sentido e o delírio surge como verdade incontestável. Caramba, e eu tomei bastante porrada por causa disso. Inclusive de gente que nunca seguiu as regras, realmente absurdas, da quarentena generalizada. Mas isso não importa. Falem o que quiserem, eu vou continuar fazendo as minhas análises.
Até mesmo a estratégia chinesa no primeiro momento, com o lockdown em Wuhan, por algumas semanas, me pareceu exagerada, ¨coisa de comunista¨, mas logo depois surgiu como uma forma bem razoável de se fazer a prevenção, diante do absurdo fiasco da estratégia do mundo ocidental. Pois, ainda que bloqueasse um pequeno território por completo, por um período limitado, isso permitia que a vida social e a economia do país continuassem sem maiores prejuízos, resultando em crescimento do PIB, mesmo em 2021. Mas, agora que a estratégia de COVID zero tem levado a sucessivos lockdowns em cidades realmente importantes do país, está claro que realmente esta também é uma reação exagerada e prejudicial, levando a novas desestruturações da economia local e mundial. É claro que, apesar disto, a resposta chinesa ainda é muito mais equilibrada e certamente muito mais efetiva na prevenção à pandemia do que a ocidental, que, em geral, além de não dar certo no controle da doença, resultou em prejuízos muito maiores à economia e à vida social em geral.
Seja como for, a resposta à epidemia realmente cumpriu e continua cumprindo o papel de desestruturar cadeias de produção e forçar o desaquecimento e a reestruturação da economia mundial.
Mas não foi o suficiente e agora a guerra da Ucrânia veio dar continuidade e reforçar esse freio de arrumação na economia mundial, aprofundando ainda mais a crise e forçando ainda mais a reestruturação econômica, social e geopolítica mundial. A guerra, assim como a pandemia não podem ser atribuídas à crise econômica, mas eu entendo que teríamos respostas bem diferentes a estas circunstâncias se não fosse a crise econômica que já está em curso. Nas condições atuais as respostas à epidemia e à operação especial russa foram justamente aquelas que mais aprofundavam a crise econômica mundial, mesmo que não tivessem eficácia real. Assim como a quarentena generalizada não resultou em efetiva prevenção contra a pandemia, também as sanções econômicas contra a Rússia e o envio de armas e outros recursos militares para a Ucrânia não têm qualquer efeito decisivo sobre o curso da guerra, além de prolonga-lo e assim o seu resultado em destruição e morte, sobretudo de Ucranianos. Ambas estas respostas foram, são, absurdas do ponto de vista do controle da epidemia e da solução do conflito, mas certamente resultam, do mesmo modo, em profundas quebras em cadeias produtivas mundiais e alimentam a crise.
Agora a alta inflacionária se alastra, forçando a alta generalizada dos juros básicos, a Europa está perto de uma crise energética que pode ser extrema, no mesmo momento em que as duas maiores economias do mundo se encontram, simultaneamente, no limiar da recessão técnica. Parece que a China conseguirá manter a crise restrita ao setor imobiliário, mas parece impossível para os EUA evitarem a recessão generalizada, que, certamente já se alastra pelo mundo, de algum modo.
É claro que agora há um conjunto de ações anticíclicas e de proteção social em ação, em parte, justamente responsáveis pelo aumento da inflação, mas que, certamente, estão mitigando e muito a gravidade da crise e o do seu dano social. Mas, parece que estamos ainda longe de uma solução para esta grande crise estrutural da economia capitalista em que nos encontramos.
E esta crise, em especial, está associada a uma dupla transição histórica, que a torna ainda mais dramática. Por um lado estamos na transição final da hegemonia dos EUA na economia e na geopolítica mundial. Hoje o poderio dos EUA é muito mais assentado no militarismo do que na economia, o seu predomínio militar é hoje muito maior do que o seu predomínio econômico e esta diferença só crescerá daqui em diante. Inclusive porque para se manter com tal poderio militar os EUA perde cada vez mais a proeminência econômica, simplesmente porque tem que investir desproporcionalmente muito mais do que as outras grandes potências nos recursos militares, um invertimento que é, obviamente, ao fim, fundamentalmente destrutivo. Esta desproporção, sinal claro da queda da hegemonia americana, pode, deve, talvez, infelizmente, conduzir a novas e maiores guerras nos próximos anos e décadas. É mais ou menos óbvio que tão mais o poder dos EUA se repouse no militarismo, tanto mais ele terá que se provar na realidade, através de guerras. Guerras inúteis, pois, ao fim nada irá barrar esta queda do poder unipolar dos EUA e a emergência de um mundo realmente multipolar.
A outra transição é, de fato, o objeto deste texto, desde o princípio. Trata-se da transição econômico social para além do capitalismo. A transição social democrata e socialista. Como eu disse no primeiro parágrafo, há, nesta transição um movimento pendular, hora em direção ao liberalismo capitalista, até um extremo que, por força das crises que resultam deste movimento, ele se reverte em um movimento no sentido da socialização, do controle público sobre a economia, da proteção social e da universalização do acesso a recursos e serviços. E agora estamos em um momento crucial deste movimento pendular, o momento em que a transição de hegemonia econômica e geopolítica mundial vem sendo pontilhada por uma potência emergente socialista. Isto certamente levará o pêndulo histórico, neste movimento socializante, a uma intensidade e disseminação mundial que não poderia ter acontecido antes. Algo mais radical ocorrerá então e a transição da hegemonia dos EUA para um mundo multipolar será também um forte movimento de transição para o socialismo mundial.
Talvez seja possível rastrear esse movimento pendular, característico do capitalismo contemporâneo, até o século XIX, mas, certamente, ele é suficientemente perceptível a partir do século XX, quando um momento liberalizante que vinha desde antes do início do século, conduziu à grande crise de 29 e às grandes guerras e, claramente, um movimento socializante em resposta, a partir de então e perdurando até o início dos anos 80. É o período de expansão e estabilização do modelo social-democrata, do Estado de bem-estar social, como alternativa sistêmica concreta ao liberalismo econômico. Efetivamente a social democracia vingou de forma mais plena apenas na Europa Ocidental e mais ainda nos países do Norte da Europa Ocidental. Mas, é bem verdadeiro que esta doutrina e suas práticas tiveram projeção e penetração mundial. E, de fato, o mundo todo avançou um tanto no sentido socializante, em termos de regulação da economia, proteção social e acesso a recursos e serviços básicos. Até que, novamente, o movimento de desenvolvimento econômico encontrou fortes entraves no modelo político vigente no cenário mundial e forçou a superação de partes da estrutura social democrata e o redirecionamento do pêndulo histórico do capitalismo no sentido liberalizante, a partir do início dos anos 80. Está claro que, naquele momento histórico, o vetor socializante não podia, não pôde, atingir um ponto de transição ou de não retorno, para além do capitalismo.
Mas, eu afirmei que a transição social democrata e socialista é a transição econômico social para além do capitalismo. E isto me parece tão seguro agora. Apenas é preciso estar consciente que isto se dá através de longo processo histórico, onde se observa este característico movimento pendular que eu estou descrevendo. O movimento pendular histórico entre liberalismo e socialismo na estrutura do sistema econômico mundial. E este movimento tem como sentido inquestionável o aumento progressivo do socialismo nesta estrutura.
Alguns entre aqueles que estiveram presentes na primeira onda deste desenvolvimento e perceberam o seu sentido socializante, puderam antever que, ao fim, seria este o curso histórico predominante. Mas, muitos deles acreditaram que seria já naquela onda, naquele primeiro pêndulo à esquerda, digamos assim, que esta transição se completaria. Vendo do nível histórico atual, sabemos, com certeza, que não foi assim que aconteceu.
O que nós podemos dizer que se vê claramente na história recente é mesmo um longo processo de desenvolvimento dos mecanismos socializantes na estrutura econômico social que, simultaneamente, se integra mais, mundialmente.
Este processo é contraditório e se dá através de um movimento em ondas de avanços e retrocessos, desenvolvimento e crises que presenciamos na história contemporânea, mas, tem realmente o sentido socializante. E isto significa que a cada momento histórico em que o pêndulo vai em direção socialista, as mudanças se tornam mais profundas e permanentes na estrutura da vida social, no sistema econômico e social.
A partir de uma base verdadeiramente liberal, oriunda do surgimento do capitalismo, com a fragilidade das estruturas dos estados nacionais e da organização social de então, vemos surgindo, ao longo das décadas e séculos, em ondas de avanços e retrocessos, mas, progressivamente se enraizando, os sistemas públicos de educação de base universal, os sistemas de previdência e proteção social e garantia de renda, a regulação pública das condições e da renda do trabalho e, enfim, da economia e das finanças em geral. E isso é tão verdadeiro que parece impossível mesmo aos mais extremos liberais de hoje em dia propor a regressão liberalizante até o ponto de romper completamente com estas estruturas socialistas. No capitalismo atual isto é mais do que impossível, é impensável. Mesmo que cada momento liberalizante desfaça parte do que foi realizado e anule conquistas reais, muitas são já parte integrante e ineliminável do sistema social atual e isto é progressivo. E acabam penetrando até no próprio ideário liberal.
A experiência social democrata e socialista se fortalece no curso da história contemporânea e já foi realmente capaz de solidificar, na Europa Ocidental, um sistema de equilíbrio e bem estar social e, na China, a mais impressionante conquista histórica recente em termos de desenvolvimento humano social em geral. E isto se estenderá e se intensificará ainda mais na resolução da grande crise atual. As catástrofes da grande crise econômica e da inviabilidade de soluções civilizadas dentro do capitalismo liberal, a extrema concentração de riquezas, o desemprego, o empobrecimento e a falta de perspectivas e toda a tragédia social que vem junto com isto, incluindo o ressurgimento e a ascensão das correntes fascistas, como última forma do poder político liberal, e as guerras como soluções finais da crise, por mais que nos façam desacreditar de qualquer avanço, trazem, justamente, o estresse social necessário para que, mais uma vez, o sistema reconheça a necessidade de redirecionar-se no sentido mais racional e menos destrutivo. E, agora, num patamar ainda mais avançado e mais mundializado.
E é assim que eu vejo o socialismo se desenvolvendo, se disseminando e se enraizando na estrutura mesma do capitalismo mundial em transição. Mas não espero, nem para este atual momento pendular socializante, que está começando e deverá durar, talvez, uns 30 a 50 anos, uma ruptura completa que nos leve realmente, de fato e por fim, para além do capitalismo. Mas certamente estaremos num mundo muito mais socialista do que estamos hoje. Talvez este raciocínio nem se aplique mesmo mais ao momento atual e ao que virá na sequência, porque, de verdade, ao tempo em que estas estruturas socialistas se incorporam ao modelo social contemporâneo transformando-o inexoravelmente, se inicia também o desenvolvimento progressivo das formas anarquistas de organização e vida, que serão aquelas que, creio eu, realizarão a transição final para além do capitalismo.
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